Moto Trip – Part VII

Trindade para Paraty – RJ – dia 11 de março de 2010

Acordamos cedo e tomamos um bom café da manhã na pousada. Fomos direto procurar a cachoeira como tínhamos planejado no dia anterior. Pegamos a trilha que subia para a cachoeira e ficamos mais de meia hora rondando a corredeira, várias quebradas enlamaçadas e a mata fechada. Mas nada de chegar à bela queda que tanto falaram. Encontramos alguns casais que também estavam há bastante tempo procurando e nada. Depois de totalmente ensopados de suor, resultado da mata fechada e úmida, resolvemos desistir e ir à praia antes de almoçar e passar a tarde em Paraty.

A praia estava ótima. Cheia até certo ponto mas muito boa. A água estava fresquinha e o dia muito belo e ensolarado, com um grande céu azul. Ficamos um tempo nadando. Conversamos com uma menina que era parente de uns donos de pousada na vila. Eles tinham vindo do interior de São Paulo montar pousada há alguns anos atrás. Ela nos contou a história de que Trindade era um paraíso isolado até meados de 2000. Depois disso, descobriram o local e várias dessas famílias, principalmente do interior de São Paulo e Rio de Janeiro, resolveram tentar a sorte com pousadas e restaurantes. Depois disso, confirmou-se nosso incômodo e desconfiança das pessoas da vila por nos tratarem com tanta indiferença e até mesmo sem muito jeito pra coisa. Aquela sensação de um povo provinciano e do tratamento pouco profissional ficou claro e evidente depois desta conversa.

Voltamos para a pousada, tomamos uma ducha e nos preparamos para ir até Paraty. O correto seria colocar todo o equipamento que tínhamos. Pra chegar até Paraty é preciso pegar a estrada por mais de 10 km, em alta velocidade. Mesmo assim, a vontade de curtir o sol e a brisa falaram mais alto. E como estava tudo perfeito até agora, preferimos nem pensar no que poderia dar errado e saímos de bermuda, camiseta e tênis, no máximo com luvas. O “kbeça” ainda foi de calça e sapatos por causa do calor do motor da Drag.

Paraty é muito bonita. Uma belíssima arquitetura muito parecida com as cidades históricas de Minas Gerias, como Ouro Preto, Diamantina e Tiradentes. Só que com uma grande vantagem. O mar. As ruas de pedra, as construções coloniais, brancas com os dormentes tipicamente coloridos, as belas e grandes correntes que dividem as ruas, as portas enormes e janelas cheias de história em meio à plantas parasitas e flores, realmente nos fazem viajar por outras épocas.

Logo que chegamos estacionamos as motocicletas numa rua e fomos procurar um restaurante. Como bons turistas, paramos no primeiro com boa aparência. E valeu a pena. Ótimo serviço e comidas. No restaurante ficamos sabendo que as escunas da prefeitura só saíam de manhã. O garçom nos disse para irmos até a praia dos barqueiros e negociar direto com um deles um passeio pelas ilhas. E foi o que fizemos. Atravessamos uma larga rua até sair numa espécie de porto onde haviam vários barquinhos. Paramos para conversar com um barqueiro. Seu barco azul e branco se chamava Felipe, em homenagem ao filho. Ficamos sabendo depois que este barco era de 1980 e tinha passado por uma reforma. Coincidência ou não, o Felipe é da década de 80. E para sua tristeza é cruzeirense, azul e branco. Fomos com os “Felipes” num passeio de 2h pelas ilhas, com direito a parada para nadar no mar.

O passeio é maravilhoso. A brisa, o visual, a sensação de estar no barquinho e aquela enorme serra e mar à sua volta é impressionante. Vários peixes pulam pra fora do mar pra respirar ou comer. Depois de passar por algumas ilhas paramos em uma e o barco foi desligado. Era hora de dar um bom mergulho naquela belíssima piscina natural. Esquecemos nossas sungas e nadamos de cueca mesmo. O mar estava numa temperatura perfeita. Com o snorkel deu pra ver vários cardumes de peixes amarelos, estrelas do mar e outros animais marinhos. Na ilha vinham alguns roedores ver o que estava acontecendo e pegar comida. Um verdadeiro paraíso. O tempo de mergulho era curto, 15 minutos. Mas foi o suficiente pra aproveitar bem. Na volta já passavam das 16h e o céu estava muito belo, formando neblinas em volta da serra. Depois de descer, pagar e agradecer o barqueiro, fomos tomar água de coco e pegar as motocicletas para a volta. Antes passamos no banco, no posto e fomos embora.

Calmaria antes da tempestade

Como disse anteriormente, estava tudo perfeito até aqui. O máximo que tinha rolado eram aquelas discussões bestas de irmãos. Como já dito também, não fomos equipados para pegar a estrada. Mesmo assim, na volta, com todo aquele clima maravilhoso, o dia agradável que tínhamos passado e o final de tarde quente e amistoso, sem querer e sem pensar, percebi que no trecho da volta nos empolgamos um pouco e puxamos mais o acelerador. O “Kbeça” que sempre encabeçava a fila deu uma empolgada e este foi um dos raros momentos em que andamos mais forte. Aproveitei para testar a Falcon e ela não voltou a dar aquele problema de patinar, mesmo em velocidades mais altas. Tudo tranquilo. Não tem coisa melhor que dar uma puxada mais forte na motocicleta.

Chegando na entrada de Trindade, reduzimos e entramos na estradinha, o “Deus me Livre”. Tudo normal, a tarde ainda estava clara. Num dos trechos em que o “Kbeça” tinha escorregado na primeira vez em que passamos por lá, o Felipe fez um sinal com a mão, como se estivesse xingando e eu respondi logo atrás. Estávamos descendo, quando num dos trechos mais íngremes da estradinha, eu estava meio distraído olhando para o mar que surgia lá atrás da serra quando olho pra frente e me deparo com uma cena que não esperava. A Drag estava rabeando de um lado para o outro e o “Kbeça” voando por cima dela, caindo nas pedras no canto direito da estrada. Parecia que não era verdade. Não era possível que aquilo estava acontecendo. Passei o Felipe que deu uma reduzida e foi parando. Estacionei a Falcon na descida sem nem pensar direito e saí correndo, tirando o capacete e indo em direção ao “Kbeça”, que já tinha retirado seu capacete e estava gritando de dor. Dizia que estava sem ar e com muita dor no peito. Nisso, alguns carros que passavam pararam para ajudar. Depois de um tempo o “Kbeça” ficou mais calmo. Disse que estava bem e se levantou. Foi direto olhar a motocicleta. Esta ficou bem destruída. Não tinha mais como voltar com ela e também não sabíamos se havia algo mais grave com o acidentado. Chamamos a polícia e o resgate e lá se foi o “Kbeça”, louco da vida, para a Santa Casa de Paraty. Pra mim e pro Felipe, sobrou levar a Drag sem pedaleira direita e com o guidão torto até a pousada. Se já era meio ruim pilotá-la, foi ainda pior. Mas chegamos sem problemas e logo depois fomos até a Santa Casa saber como estavam as coisas. O médico disse que não tinha acontecido nada demais, fez algumas radiografias do peito e cabeça e deu alta para o paciente. O “Kbeça” voltou na minha garupa e paramos pra comprar alguns remédios e fazer o boletim de ocorrência, que demorou horas.

Depois disso tudo, vinha a parte mais chata, de avisar a mãe, o irmão, a mulher e alguns poucos parentes mais próximos. No dia seguinte iríamos ligar para o seguro e o “Kbeça” retornaria com o caminhão de reboque.

Ficou uma lição disso tudo? Claro que sim. O “Kbeça” deu muita sorte pois estava sem luvas e mesmo assim não machucou a mão. A motocicleta pesada, quase caiu em cima dele, o que teria tornado as coisas muito piores. Num trecho que teoricamente tínhamos achado muito tranquilo de passar, aconteceu o único acidente de todo o passeio. E poderia ter sido fatal. Todos concordamos que a Drag contribuiu bastante para isso pois não tem mesmo o DNA de fora de estrada, mesmo que este “fora” seja brando. Mas no final deu tudo certo. Hoje a moto já está prontinha. E também já deu tempo do “Kbeça” se acidentar novamente. Desta vez com um cachorro que o atropelou na rua, em São Paulo.

Faltavam apenas dois dias para encerrarmos nossa trip. Mas com o que havia acontecido não tinha mais clima. O “Kbeça” voltaria de carona com o caminhão do seguro e Felipe e eu retornaríamos para São Bernardo do Campo. Restava apenas decidir se passaríamos em Campos do Jordão ou não.

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